Retrato de Camões - desenho a pena e mancha a tinta da china, 1934
por Almada Negreiros
LUÍS, O POETA SALVA A NADO O POEMA
Era uma vez
um português
de Portugal.
O nome Luís
Há de bastar
toda a nação
ouviu falar.
Estala a guerra
e Portugal
chama Luís
para embarcar.
Na guerra andou
a guerrear
e perde um olho
por Portugal.
Livre da morte
pôs-se a contar
o que sabia
de Portugal.
Dias e dias
grande pensar
juntou Luís
a recordar.
Ficou um livro
ao terminar
muito importante
para estudar.
Ia num barco
ia no mar
e a tormenta
vá d’estalar.
Mais do que a vida
há de guardar
o barco a pique
Luís a nadar.
Fora da água
um braço no ar
na mão o livro
a guerrear
e perde um olho
por Portugal.
Livre da morte
pôs-se a contar
o que sabia
de Portugal.
Dias e dias
grande pensar
juntou Luís
a recordar.
Ficou um livro
ao terminar
muito importante
para estudar.
Ia num barco
ia no mar
e a tormenta
vá d’estalar.
Mais do que a vida
há de guardar
o barco a pique
Luís a nadar.
Fora da água
um braço no ar
na mão o livro
Há de salvar.
Nada que nada
sempre a nadar
livro perdido
no alto mar.
— Mar ignorante
que queres roubar?
a minha vida
ou este cantar?
A vida é minha
ta posso dar
mas este livro
há de ficar.
Estas palavras
hão de durar
por minha vida
quero jurar.
Tira-me as forças
podes matar
a minha alma
sabe voar.
Sou português
de Portugal
depois de morto
não vou mudar.
Sou português
de Portugal
acaba a vida
e sigo igual.
Meu corpo é Terra
de Portugal
e morto é ilha
no alto mar.
Há portugueses
a navegar
por sobre as ondas
me hão de achar.
A vida morta
Nada que nada
sempre a nadar
livro perdido
no alto mar.
— Mar ignorante
que queres roubar?
a minha vida
ou este cantar?
A vida é minha
ta posso dar
mas este livro
há de ficar.
Estas palavras
hão de durar
por minha vida
quero jurar.
Tira-me as forças
podes matar
a minha alma
sabe voar.
Sou português
de Portugal
depois de morto
não vou mudar.
Sou português
de Portugal
acaba a vida
e sigo igual.
Meu corpo é Terra
de Portugal
e morto é ilha
no alto mar.
Há portugueses
a navegar
por sobre as ondas
me hão de achar.
A vida morta
aqui a boiar
mas não o livro
se há de molhar.
Estas palavras
vão alegrar
a minha gente
de um só pensar.
À nossa terra
irão parar
lá toda a gente
há de gostar.
Só uma coisa
vão olvidar:
o seu autor
aqui a nadar.
É fado nosso
é nacional
não há portugueses
há Portugal.
Saudades tenho
mil e sem par
saudade é vida
sem se lograr.
A minha vida
vai acabar
mas estes versos
hão de gravar.
O livro é este
é este o canto
assim se pensa
em Portugal.
Depois de pronto
faltava dar
a minha vida
para o salvar.
mas não o livro
se há de molhar.
Estas palavras
vão alegrar
a minha gente
de um só pensar.
À nossa terra
irão parar
lá toda a gente
há de gostar.
Só uma coisa
vão olvidar:
o seu autor
aqui a nadar.
É fado nosso
é nacional
não há portugueses
há Portugal.
Saudades tenho
mil e sem par
saudade é vida
sem se lograr.
A minha vida
vai acabar
mas estes versos
hão de gravar.
O livro é este
é este o canto
assim se pensa
em Portugal.
Depois de pronto
faltava dar
a minha vida
para o salvar.
In: Obra completa / Almada Negreiros; org.
Alexei Bueno; introd. José-Augusto França. Rio de Janeiro: Nova
Aguilar, 1997, pp. 191-193.
Camões salva "os Lusíadas" a nado - imagem por Filipa Canhestro.
imagem (pormenor) que ilustra o poema de Almada,
imagem (pormenor) que ilustra o poema de Almada,
In: Poetas de hoje e de ontem, 2007; 6.ª ed., 2014.